XuCruTinho
terça-feira, novembro 18, 2003
 
Diário de bordo: um passeio matinal no Inter 2

Há um título que paira sobre a Curitiba, que jamais fora oficializado entre os tantos já atribuídos à capital - Curitiba, a cidade dos ônibus. Existem coletivos de todas as cores (vermelhos, cinzas, verdes, alaranjados, amarelos, brancos) e tamanhos (biarticulados, articulados, sem articulação e os microônibus) circulando pelas ruas, indo para os mais variados destinos.

Curitiba investe em seus ônibus, tanto é que o pessoal do exterior está sempre por aqui para "imitar" o jeito curitibano de conduzir seus cidadãos, liderando a lista de estratégias favoritas as estações-tubo, os ligeirinhos e os biarticulados. No currículo estão países como Bolívia, China, Caracas, São Francisco e Zimbábue. Para a União Internacional de Transporte Público, é o transportar mais eficiente e bem-estruturado da Terra.

Como não é possível convidá-los todos para um passeio às sete horas da manhã pela linha do Inter 2, no dia 2 de novembro de 2003 o fiz sozinha a fim de experimentar este glamour que rodeia os nossos ônibus coletivos.

Sete e cinco exatamente eu estava apresentando o meu vale-transporte na catraca do terminal do Portão. Pressa era a única coisa evidentemente em comum entre as pessoas ao meu redor. Caminhei em direção ao tubo do Inter 2 e, sem precisar me aproximar muito, vi logo na entrada uma aglomeração deformada de pessoas, que impedia qualquer tentativa de passagem.

O primeiro ônibus passou e eu continuava do lado de fora do tubo. Fui tentar uma subida forçada pela escada da estação, mas as pessoas que chegaram naquele Inter 2 continuavam se digladiando com os que esperavam pelo seu ônibus. O prêmio do grupo vencedor era um espaço para permanecer ou conseguir sair. Uma senhora que passara por mim na saída do tubo virou para trás e xingou os que a empurraram: "Ô educação! Não respeita nem os mais velhos".

Finalmente estava no tubo. Mais um ônibus chega e a cena é familiar: o bolo feito de gente mais uma vez. Quando as portas do Inter 2 se abriram, os passageiros grudados no vidro da porta inevitavelmente caíram para fora do ônibus devido ao aperto. E mesmo a falta de espaço sendo gritante, grande parte do povo dentro do tubo insiste em entrar. A porta fecha e o veículo sai. Para fora das janelas, os dedos dos que tentam se equilibrar segurando-se na abertura.

Agora era a minha vez de entrar. Era quase sete e quinze e eu continuava ali. O ônibus seguinte chegou rápido e também se mostrava carente de espaço físico. O jovem atrás de mim, Eduardo Augusto, de 19 anos, resmungou, num desabafo que não tinha a intenção de ser ouvido: "Lotado...".

Assim que as portas do Inter 2 se abriram, eu não precisei sequer decidir entrar. Os que aguardavam atrás de mim fizeram isso em meu nome, me empurrando para frente num impulso massivo. A entrada não teria sido tão dramática se não houvesse pessoas querendo sair do ônibus. Foi o maior choque de culturas já presenciado: a tribo dos que querem entrar confrontando a tribo dos que querem sair. A luta é silenciosa e sem vencedores.

Durante a viagem, respirando o ar viciado (resultado da abertura de pouquíssimas janelas) e sendo machucada por um cotovelo que eu não tinha idéia de onde vinha, veio-me à mente Kátia Karam, assessora de comunicação da Urbs, falando-me pelo telefone a respeito do número de passageiros que circulavam pelos terminais diariamente: "Os ônibus não estão lotados. São as pessoas que não têm paciência de esperar por um mais vazio". No dia 4 de novembro, às 7:00 horas eu voltei ao terminal do Portão a fim de esperar por um ônibus mais vazio. Os dados levantados correspondem não apenas ao esvaziamento do coletivo, mas também da estação-tubo. O primeiro ônibus humanamente habitável chegou uma hora depois, por volta das 8:05. Porém a estação-tubo esvaziou um pouco mais tarde, às 8:15, o que resultou em novas aglomerações neste período de 10 minutos.

A próxima parada era a estação Santa Quitéria. Da janela vi as pessoas dentro do tubo com expressões desanimadas assim que a porta do ônibus se abriu. Exatamente três pessoas saíram do veículo e exatamente oito entraram. A saída ou a entrada de apenas um passageiro influencia instantaneamente no grau de proximidade entre as pessoas dentro do coletivo.

Olhei no relógio, 7:43. Fazia oito minutos que eu estava viajando, o que significava que eu havia levado aproximadamente meia-hora para conseguir estar ali. Lembrei de Kátia mais uma vez. "Esses dias mesmo, eu vim de Inter 2 para o trabalho. Os primeiros chegaram cheios, mas foi só eu esperar um pouco no tubo para pegar um vazio. E olha que eu peguei no terminal do Cabral, que é muito lotado". Perguntei: "Mas você não disse que os ônibus não estão lotados?". Com um olhar aborrecido, ela respondeu: "Toda cidade tem horários de pico. É normal. Vai pegar ônibus em São Paulo ou no Rio de Janeiro pra você ver como Curitiba tem um sistema de transporte exemplar".

Mais um trecho da viagem se completava. No Campina do Siqueira, boa parte dos passageiros desembarcou. Uma sensação de alívio evidenciou-se nas expressões faciais dos que ficaram. O motivo não precisa nem de investigação para ser descoberto - os ombros e os joelhos alheios deixaram de nos pressionar por todos os ângulos. Porém, o contentamento foi breve, pois assim como muitas pessoas precisavam descer no Campina do Siqueira, outras muitas também precisam embarcar. Retornei então ao ponto de partida, em que cotovelos e sacolas pesadas me empurravam impiedosamente e respirações quentes e cansadas sopravam no meu pescoço.

Na próxima estação, o tubo Mercês, era onde eu pensava em descer. Mas mudei de idéia quando uma jovem entrou no veículo dizendo em voz alta, entre pedidos de licença: "Vamos lá, gente, aperta aí que cabe, tem que ser econômico". Ela parou justamente ao meu lado. Não resisti e comentei: "Bom, se consola, em São Paulo é muito pior". "Não consola, mas não tem problema, porque isso aqui não tem consolo", riu Mariliz Polzin, 24 anos, psicóloga. "Você também acha que é pouco ônibus?". "Eu não sei o que é... Eu sei que a gente paga imposto e que a gente tem que ser exigente. Se em São Paulo o povo acha que pegar lata de sardinha é normal, aí é com eles", riu de novo. Durante o percurso inteiro, incluindo as passadas pelos terminais, foi a única risada que ouvi.


Alguns dados inúteis que podem interessar

Os ônibus expressos passaram a circular nas canaletas de Curitiba a partir da década de 70. Depois vieram os ônibus articulados e, em seguida, os biarticulados. Eles comportam até 270 passageiros, mas o sistema está operando no limite nos horários de pico.

Na Grande Curitiba são 1.250.000 passageiros/pagantes em dias úteis e 2.050.000 transportados. Frota Total Sistema Integrado - 2.160 ônibus. Frota Total Grande Curitiba - 2.530. Curitiba possui 351 estações-tubo. Terminais de integração são 21 urbanos e 7 metropolitanos. Atualmente, um ônibus passa a cada 50 segundos na cidade.

O eixo sul (Pinheirinho-Centro) é o que enfrenta o maior congestionamento nos horários de pico, chegando a carregar 35 mil passageiros/hora/sentido. Com o metrô leve, a capacidade de carregamento pode alcançar 45 mil passageiros/hora/sentido e haverá a opção do Eixo Metropolitano de Transportes (ônibus biarticulados na BR-476), que poderá levar 11 mil passageiros/hora/sentido. No sistema integrado são 21 mil viagens por dia/útil. Na Grande Curitiba são 23 mil viagens por dia/útil.

Fonte: site da prefeitura de Curitiba
 
Em 100% das vezes em que perguntam meu nome e eu digo que é Gabriela, ouço um “Gabriela? Cravo e canela?”, seguido de uma risada. E todas estas pessoas realmente acreditam que a piadinha é super original. Se eu te chamar de jaguara é porque gosto de você. Jesus é tudo pra mim.

Nome:
Local: Brazil

Anos se passaram, Gaby é jornalista formada, locutora de rádio, e continua molhando o pão no Nescau. Sou adepta do regime eterno, ainda tenho problemas sérios para comer de palitinho e fico levemente ofendida com a careta que as pessoas fazem quando eu conto que tenho um gato e ele se chama Xaninho. “Xaninho?? Que nome é esse?”. Um dos meus hobbies é gente esquisita. Eu adoro prestar atenção na história delas. Tenho medo do orkut. E de mariposas peludas. Ui. Eu costumo sonhar com pessoas famosas. Já sonhei que o Eminem vendia perfumes, que o Keanu Reeves estudava comigo e pegava um ônibus chamado “Vila Adidas” para voltar pra casa e que o Bon Jovi era meu melhor amigo. Eu gosto muito de torta de limão.

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