XuCruTinho
Pai, eu tenho 20 anos. Independente do que você pensa (e do que eu penso), eu sou uma adolescente. E está provado por todas as medicinas, e pela psicologia, que os adolescentes precisam da presença efetiva do pai.
Mesmo com toda a sua frieza, o seu silêncio, o seu jeito de me contrariar que faz com que eu me sinta burra e estúpida, eu te considero importante no meu coração. Mesmo você se comportando como se eu não estivesse ali ao seu lado, como se a minha presença fosse nula, me corrigindo como se eu fosse incapaz de pensar por mim mesma, ainda assim eu sinto que você é bem-vindo na minha vida.
Quando eu estou com você, eu sinto fortemente a sua falta de carinho, a sua dificuldade de abraçar, a sua questão de falar como eu lhe trago gastos, prejuízos, problemas financeiros. Eu me sinto um estorvo. Um endurecimento acidental da pele causado por atrito continuado. Sinto como se eu te incomodasse, como se eu te trouxesse problemas.
Mas ainda assim... Ainda assim sinto você o meu pai. E te quero assim.
Porém o preço é muito alto.
O preço é alto demais.
Tchau, pai.
Eu te amo.
Ontem eu fiz algo incorreto.
Saí na náiti no meio da semana. Sendo que eu tinha aula no dia seguinte!
*UAU* (coro de leitores admirados)
Era aniversário do namorado da Iza.
Na hora que a Iza ligou me convidando, a primeira coisa que eu pensei foi que não podia. Era meio de semana, tinha que acordar cedo no dia seguinte, aula, estágio... Apenas segundos mais tarde fui pensar se eu estava com vontade ou não. Eu estava. Sair, dar uma reboladinha em público, passar sombra no olho, todo aquele processo de pré-noitada... Soou uma boa idéia.
Fomos num barzinho daqui que tem uma decoração a lá faroestão. Você jura que o Beto Carreiro vai sair dali a qualquer instante em um show de tiroteio. Coisa fina.
Foi um passeio pitoresco. Aconteceu tudo o que eu não esperava: eu me diverti, dei muita risada, achei o namorado da Iza legal, as amigas dele também, a banda era boa e eu dancei Tribalistas. Sim, Tribalistas. Marisa Monte, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes nos fizeram o favor de reunir todas as rimas ricas num só cd. Ô coisa ruim que é isso.
Pausa para a rima rica: "A gente canta, a gente dança na nossa velha infância".
A nível de homem, só deu bizarrão feioso (ó a redundância), mas isso não foi o bastante pra eu desanimar. Tudo foi motivo de risos.
Cheguei em casa era três da manhã. Mas fui dormir às quatro.
Explico: quando fui até a cozinha tomar água, vi que tinham cozinhado pinhão. Aí desandou tudo... Fiquei até às quatro da matina comendo pinhão gelado e pensando na vida.
Conclusão?
Amei ter saído no meio da semana, mas nunca mais faço isso.
Acordei atrasadíssima, desfalecendo de sono, olhos parecendo estar cheios de areia, sem o menor senso de direção, tropeçando nos montinhos do carpet (cada um tem aproximadamente -1 milímetros de altura) e sem a menor vontade de viver. Boicotei a faculdade, acordei em cima da hora de ir pro estágio (eu entro às *cof cof* duas da tarde), tomei um banho rapidásso pra tirar a catinga cigarrânea dos cabelos, comi voando (quase abrindo um buraco na traquéia pra enfiar a comida ali e não perder tempo mastigando) e fui trabalhar. Dá pra imaginar o chuchuzinho que a Gaby estava quando chegou no escritório, não é?
Mas aquele pinhão gelado... Olha... Vou te contar... Estava tudo.
Iza, me diverti muito! Te adoro, fi-ínha!
p.s. só pra esclarecer, caso alguém da Academia Brasileira de Letras acidentalmente adentre o Xucrutinho, a palavra "cigarrânea" não existe. Por isso, não a reproduzam em seus textos futuros. Obrigada.
antes, ser modelo era assim:
hoje é assim:
exatamente igual aos namorados que passaram pela minha vida.
ontem foi meu primeiro dia na psicóloga.
medásso de descobrir coisas obscuras sobre mim.
aquelas coisas de inconsciente, que você guardou bem guardadinho por muitos anos
e quando chega no consultório, só de olhar pra tua cara, a psicóloga já solta: "você é claustrofóbica, espaçosa, maníaca, homossexual, pedófila, santinha e hipócrita".
ela iria se espantar com os meus problemas, dar um tapinha nas minhas costas e me mandar embora.
eu tinha certeza disso.
eu sempre fui tão complexada, sempre tive questões em aberto com o meu pai, discussões interessantes com o meu irmão, brigas bizarras com a minha mãe... eu tinha medo do ser humano que a psicóloga iria descobrir em mim.
depois de duas horas de sessão, depois que eu ajeitei as almofadas, que simbolizavam os meus papéis na vida minha, depois que eu falei tudo o que eu queria, ela disse: "é, Gaby, tem coisas que a gente vai ter que trabalhar aqui, mas não vejo nada de grave".
YES!
ESTOU PRESTES A SER SAUDÁVEL!